segunda-feira, 22 de junho de 2009

n. 7

Os olhos ardem no final do dia. Dizem que lentes de contato acumulam proteína. Eu, que pouco penso nas razões científicas como boas explicações, sinto o ardor como presságio ou manifestação. Do que é ruim, com certeza, dirão. Sim, sim, talvez seja. Mas não sei nem se isso mesmo, o ruim, o bom, é possível desvendar. É uma inebriação neste misticismo tolo - isso eu sei - que me faz pensar nos olhos ardendo enquanto queria mesmo era pensar nesse amor, tanto, tanto, que vai se escorrendo. Afinal, é assim que se representa a verdade.
Vai se escorrendo para fora, como resultado de um nariz gripado? Não creio. Sinto-o escorrendo dentro de mim, pois se antes o tinha na cabeça e depois no coração, agora parece que me pesa no estômago. E, no entanto, continua aqui! Qualquer esperto pode reparar nisso. Não me arde, mas pesa, como banquete que não consigo filtrar e absorver.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

n. 6

É uma sensação de amargo na boca esse não saber se que o está passa ou fica. Ou se já passou e não vi.

sábado, 13 de junho de 2009

n. 5

A condição imposta por uma vida é se submeter à concretude do que não se deseja e, mais que isso, do que aflige. Essa submissão, ela é apenas condição, não é a vida ela mesma. Negociamos com o que não é nosso para atingir a plenitude.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

n. 4

Hoje ela pensa no mundo que (a) carrega. E ela está sentindo toda a intensidade do que se leva.

sábado, 6 de junho de 2009

n. 3

A sensação de não dormir bem à noite. De não aproveitar bem o tempo. De estar se consumindo nas horas que passam. Sem entender, o que é seu não se realiza, mas, mesmo assim, vira passado.

"Deixem-me ser uma folha de árvore, titilada por brisa,
A poeira de uma estrada involuntária e sozinha,
O vinco deixado na estrada pelas rodas enquanto não vêm outras,
O pião do garoto, que vai a parar,

E estremece, no mesmo movimento que o da terra,
E oscila, no mesmo movimento que o da alma,
E cai, como caem os deuses, no chão do Destino."

n. 2


Que é da vida nesse tempo a passar? Passa como o ônibus sacolejando enquanto o sol esquenta olhos de sono. Não é de pensar nem sentir tanto. Há apenas o calor nos olhos e o balanço que faz cochilar. Significa pouco esse calor e, quanto ao balanço, é menos que nada. Como vim parar aqui? Nesse lugar de pouca substância de eu, aborreço-me com o se mostrar imediato das coisas. Mas apenas a mim cabe culpa que a mais ninguém pertence essa falta tanto cultivada. É no espaço vazio da evidência que melhor represento o guardado.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

n. 1

O que está dentro e não deixa sair todo o resto é essa vontade rouca de escrever que valha. Que só se acaba quando se realiza – é perverso o desejo desse fazer alguma coisa que não fosse tudo o mais que faço. Carrego algo que espera pelo meu toque e essa é a angústia suprema: do precisar capturar em palavras o que já está capturado aqui no fundo, bem preso a não deixar mais nada escapar. Só em escritos vários há chance para essa libertação reversa, de prender pra fora o que prende tudo pra dentro. E assim a vida caminha com o atraso impaciente de quem não se importa em perder a hora, mas não suporta ver passar o tempo.